Social Justice

Alimentando a cidade chinesa

Entrevistas com estafetas na China, traduzidas pela primeira vez a partir da sua publicação viral no WeChat.
Os estafetas de refeições são a pedra angular que sustenta um mercado,na China, que produz cerca de 300 mil milhões de RMB por ano. A pandemia de COVID-19 agravou as suas já difíceis condições de trabalho, mas também deu origem a uma mobilização espontânea através de plataformas de Internet e redes de ajuda mútua.
Os estafetas de refeições são a pedra angular que sustenta um mercado,na China, que produz cerca de 300 mil milhões de RMB por ano. A pandemia de COVID-19 agravou as suas já difíceis condições de trabalho, mas também deu origem a uma mobilização espontânea através de plataformas de Internet e redes de ajuda mútua.

A pandemia da COVID-19 que eclodiu na China no início do ano tem sido um prova sem precedentes para o país. As medidas do confinamento "fortes" adotadas em todo o país contiveram o risco de infecção cruzada por pessoas que se deslocam e reúnem em multidões.

No entanto, para que os residentes cumpram as ordens [de confinamento] do governo e fiquem confortavelmente em casa para combater o vírus, os trabalhadores comunitários, os estafetas de refeições e os estafetas de encomendas tiveram de assumir riscos acrescidos e maiores cargas de trabalho a fim de assegurar a satisfação das necessidades materiais básicas de todos os residentes.

De acordo com os relatórios, tal como as fábricas e escolas fecharam em todo o país e os restaurantes começaram a aceitar só encomendas ‘para fora’, o país inteiro ainda dispunha de 700.000 trabalhadores nos seus postos de trabalho para entregas de alimentos, facilitando a vida das pessoas

O que significa tornar-se um soldado de infantaria deste exército de muitos milhares? Quem conhece as alegrias e tristezas da vida entre eles? Tendo sido inicialmente apresentados pela Takeout Delivery Workers' Alliance (Aliança dos Estafetas), nós comunicamos com Guo Yongqiang de Xangai. Yongqiang, por sua vez, convidou o "Irmão Long" de Lujiazui [Lokatse, em Pudong]. No final de Abril, a nossa equipa de entrevistadores de estafetas, teve a oportunidade de falar com eles.

"Os estafetas desta sessão de entrevista incluem uma pessoa na casa dos trinta (Irmão Long) com uma estrutura robusta e rosto corado, que durante o curso da nossa conversa demonstrou energia e zelo. Sendo já pai, ele parece nutrir muitas aspirações sobre o que quer alcançar na vida. A outra pessoa era um jovem alto e magro, na casa dos vinte anos (Yongqiang) de Gansu. Quando entrou na sala, o seu vestuário limpo e bem apresentado - desde o blusão corta-vento e da camisa até aos sapatos de couro - causou-me alguma perplexidade. Ele não parecia o típico estafeta. Mais tarde, descobri que ele tinha arranjado um emprego de segurança enquanto ainda continuava a administrar ativamente o seu grupo de conversa WeChat de estafetas. Este é um jovem que, aos 15 anos de idade, saiu de casa para fazer o seu próprio caminho no mundo, que tinha sido enganado antes, que fala de forma tímida mas que é independente. Estas duas pessoas foram entrevistadas por quatro entrevistadores mas após a entrevista ainda tinham muito mais a dizer", recordou um dos entrevistadores, Ya Tong.

Nesta primavera invulgar, eles e os estafetas que representam foram abalados - o número de encomendas caiu substancialmente, no entanto, as dispensas de trabalhadores causadas pela pandemia intensificaram a concorrência dentro da atividade de estafetas. No meio de uma incerteza crescente, que caminho tomarão estes estafetas?

"Não temos realmente outra escolha senão passar sinais vermelhos": um travão para os estafetas na era dos big data

Ouvimos muitas vezes nas notícias que "estafetas foram multados por passarem semáforos vermelhos", ou que chocaram com peões ou causaram conflitos por conduzirem demasiado rápido. No entanto, será isto realmente o resultado de estes estafetas valorizarem o dinheiro que ganham acima da sua segurança ou da segurança de outras pessoas? O Brother Long explicou-nos a sua perspectiva sobre esta questão.

"Na verdade, o facto de os estafetas passarem sinais vermelhos é também porque não temos escolha, na verdade somos forçados a isso. E porquê? Por exemplo, se um cliente fizer uma encomenda e o tempo limite for de 30 minutos, quando o sistema nos enviar a encomenda já só teremos 28 ou 29 minutos. Às vezes, quando chegamos ao vendedor para buscar a comida, temos de esperar 2 ou 3 minutos. Se o vendedor nos consegue entregar a comida logo, isso é muito bom, mas, se não conseguir e precisar de mais 10 minutos, já só ficamos com 10 minutos para entregá-la quando nos chega às mãos. Se eu tiver cinco encomendas de cada vez, terei de correr para três ou cinco lugares diferentes, receber cinco refeições diferentes e entregá-las depois a cinco clientes diferentes. Este intervalo de tempo é de facto demasiado apertado. A plataforma não se importa. Eles só me avisam que um cliente fez uma encomenda, que eu tenho de a entregar dentro de meia hora, e de que serei penalizado se ultrapassar o tempo".

Embora a rede Meituan dê alguma margem de manobra aos estafetas nos casos de atrasos ou reclamações de clientes, essa margem é na realidade extremamente limitada, e eles não oferecem consideração suficiente aos muitos e variados problemas que os estafetas irão provavelmente enfrentar em condições de trabalho reais. O Brother Long dá-nos um exemplo. No início, a Meituan tinha um período de tolerância de sete minutos, em que se a comida fosse entregue em 37 minutos, isso não seria considerado ultrapassar o limite de tempo. Contudo, se considerarmos que o estafeta tem de ir buscar a comida, esperar por ela e depois entregá-la dentro deste período de tempo, tendo em conta todos os imprevistos que podem surgir, esta pequena tolerância está longe de ser humana. Além disso, no sistema de avaliação da Meituan, a percentagem de erros aceitáveis para cada 100 encomendas é de 5 por cento. Por outras palavras, os motoristas são penalizados após mais de cinco entregas tardias. Além disso, as penalidades são aplicadas com base na percentagem de encomendas que o estafeta entrega a tempo. Isto significa que se a taxa de entrega pontual de um estafeta for baixa, os seus rendimentos diminuem de forma correspondente. Mesmo que as restantes 90 encomendas (de cada 100) sejam entregues dentro do prazo, o pagamento de cada uma delas será feito com base no facto de a percentagem de erros nas encomendas ser superior a 5 por cento.

Então, quem está a controlar e a moldar as condições de trabalho dos estafetas? Não são gerentes nem chefes de estação, mas sim um sistema baseado em algoritmos que atribuem automaticamente as encomendas aos estafetas. Plataformas de sistemas de entrega, como a Meituan e a Ele.me, enviam automaticamente a encomenda ideal para cada estafeta com base nas capacidades do trabalhador e na rota de entrega, entre outros factores. Mas esta "plataformização" de entrega de encomendas também traz uma solução de "tamanho único" para a gestão. A própria taxa de erro é uma estimativa grosseira e conservadora, que dificilmente toma em conta as situações extremamente complicadas e muito diversas enfrentadas por diferentes estafetas devido às condições meteorológicas, às condições das estradas, à velocidade com que diferentes empresas produzem encomendas, e outros factores.

Ainda mais perigoso é o facto de que, sob este tipo de sistema de avaliação, uma taxa de entrega pontual baixa resulta num pagamento baixo. Ao fim de um tempo, pode chegar a um ponto em que não lhe serão atribuídas mais encomendas, o que significa que foi completamente expulso do processo de "avaliação", perdendo assim o direito a ser explorado. Neste processo, os algoritmos de IA controlam cada acção e a velocidade e qualidade do trabalhador, enquanto o trabalhador é forçado a ter um elevado grau de autodisciplina. Como resultado, este tipo de trabalho está muito longe da liberdade, flexibilidade e alta remuneração que é anunciada durante a publicidade de contratação destas plataformas de takeout. Pelo contrário, é um "modelo de controlo de trabalho preciso e dinamicamente ajustado". Quando os estafetas estão supostamente a escolher livremente as suas horas de trabalho (ao contratar, a plataforma frequentemente anuncia "leve-o com calma, leve-o a sério, ou leve-o ao limite", dando a impressão de que os estafetas têm um elevado grau de escolha), estão de facto a descarregar uma ferramenta precisa de controlo e estão a ser forçados a adaptar-se aos caprichos da IA. Assim, e não é difícil de compreender, a razão pela qual os estafetas tratam o tempo como dinheiro é porque realmente não podem suportar as consequências de não alcançarem a "taxa de entrega pontual" padrão.

Para além disto, porque a plataforma transferiu parte do papel de supervisão da mão-de-obra para o consumidor sob a forma de classificações de clientes, uma má classificação pode sujeitar um condutor a uma penalização de 20 RMB, enquanto que com uma "reclamação" podem incorrer em centenas de RMB em penalizações. Como resultado, o receio de fazerem uma entrega atrasada que poderá levar a uma má classificação pelo cliente, causa a muitos estafetas uma pressão emocional extremamente grande quando fazem entregas. A fim de evitar que os clientes lhes dificultem as coisas no decurso da entrega, muitos estafetas tratam de dizer ao cliente o maior número possível de simpatias ao mesmo tempo que suportam este stress, colocando a sua própria dignidade e auto-estima no fundo das suas prioridades. Contudo, como o sistema de classificação da Meituan é anónimo, por vezes mesmo que um estafeta receba uma má classificação, não teriam qualquer ideia de onde veio. Tudo o que o estafeta pode fazer é sofrer em silêncio. O mais importante é que as multas das reclamações não voltam para os clientes. "Quem sabe para onde vai tudo no final?" disse-nos o Brother Long.

Além disso, para acabar com situações em que os estafeta apertavam o botão "entregue" antes de entregarem a encomenda, a Meituan aproveita a função GPS da plataforma para seguir a localização do condutor em tempo real. Se o condutor violar essa regra, receberá automaticamente até 500 RMB em penalidades sem qualquer aviso.

Para além de transferir todos estes riscos ao estafeta e redireccionar a insatisfação do cliente com a "plataforma" para os próprios trabalhadores, as plataformas são também são incrivelmente duras ao lidar com "penalizações" e "penalizações de cancelamento". As plataformas adoptaram o fluxo de trabalho de "primeiro penalizar, depois reportar, auditar e cancelar", a fim de lidar com as penalizações. Isto quer dizer que, independentemente da situação, o estafeta assume a responsabilidade por defeito. Veja-se, como exemplo, a ‘checklist’ da Meituan para a situação: "Vês que em breve irás ultrapassar o tempo, mas o cliente não atende o seu telefone. O que deves fazer?":

  1. O estafeta deve chegar ao local designado e ligar várias vezes ao cliente por telefone. No caso de ninguém atender o telefone durante todas as tentativas, passar ao passo
  2. Detalhes da encomenda -> Ocorreu Problema -> Não é possível contactar o cliente -> Tentativa de marcar todos os números de telefone utilizados pelo cliente. Se assim ainda não alcançou o cliente -> Comunicar um problema

    Se o cliente iniciar uma segunda tentativa de entrega dentro de 30 minutos, então deverás completar a entrega.

    Se o cliente não iniciar uma segunda tentativa de entrega dentro de 30 minutos, poderás cancelar a encomenda sem penalização. A encomenda deve ser devolvida à empresa, e o deves tirar uma fotografia como prova e carregá-la na aplicação.

  3. Se o cliente iniciar uma segunda tentativa de entrega, poderás prolongar o tempo atribuído com base na situação, a fim de evitar passar o tempo.

    Se o cliente não iniciar uma segunda tentativa de entrega, deverás cancelar a encomenda. Dentro de 2 horas após a devolução da encomenda, podes evitar uma dedução de cancelamento e ser automaticamente reembolsado a taxa de entrega.

Este processo não só é monótono e complicado, como o estafeta também não recebe qualquer compensação extra pela segunda tentativa de entrega e tem de enfrentar incerteza adicional. E se um estafeta incorrer numa penalização de entrega tardia devido a não ser permitido entrar no condomínio, condições meteorológicas ou outros motivos que não sejam causados pelo próprio, as plataformas tratam esta questão de acordo com um processo semelhante. Isto também para dizer que, no processo de trabalho, os estafeta são frequentemente colocados em posições de desvantagem. A plataforma tem total poder de decisão sobre se o pagamento deduzido voltará no final à conta do estafeta. Entretanto, os estafeta são frequentemente sobrecarregados com encomendas no decurso do trabalho, não tendo assim tempo para defender os seus próprios direitos.

As engrenagens silenciosas da cidade?

Na sequência da pandemia, muitas empresas exportadoras viram as suas encomendas drasticamente reduzidas. Normalmente, estas fábricas de produção em grande escala são locais importantes que recebem a mão-de-obra excedentária do campo e de pequenas cidades e vilas. Actualmente, porém, para muitos jovens que estão desempregados devido ao encerramento de fábricas, ir para cidades de “nível 1” para trabalhar na entrega de alimentos é a sua melhor hipótese entre todas as restantes opções.

O Relatório de 2018 sobre estafetas da plataforma Meituan-Dianping ("Meituan-Dianping: 2018 Research Report on Takeout Delivery Drivers") desmonstra que 75 por cento dos estafetas vêm das províncias de Henan, Anhui, Sichuan, Jiangsu e Guangdong. Quase 70 por cento dos estafetas optaram por deixar as suas cidades de origem para tentarem ganhar a vida em cidades de Nível 1 ou de Nível 2. Relativamente à idade, os estafetas encontram-se sobretudo na população jovem, tendo 82 por cento da comunidade entre 20 e 30 . Quase metade deles vivem na sua área de trabalho actual há 9 anos ou mais, tendo criado raízes profundas na cidade. No que diz respeito à distribuição por sexo, 90 por cento dos estafetas são de sexo masculinos, enquanto 10 por cento pertencem ao sexo femininos. A partir destes números, podemos esboçar um retrato dos estafetas da vigorosa e ascendente China do presente: são um grupo de homens jovens de origem rural que são residentes urbanos de longa data, na esperança de alcançarem a auto-actualização na cidade.

Tendo vindo para a grande cidade, além de perseguirem encomendas, como é a vida quotidiana destes estafetas? Que tipo de interacção social, vida amorosa, circunstâncias de vida e planos pessoais é que têm?

Começaremos por discutir as circunstâncias de vida e o custo de vida. Tomemos Xangai como exemplo, o Brother Long diz-nos que uma situação comum na sua estação de entregas, localizada em Lujiazui, é que os estafetas alugam residência em grupos, com oito estafetas a dormirem num apartamento de apenas 20 metros quadrados. Este tipo de apartamento em Lujiazui custa cerca de 800 RMB por mês, mesmo que o custo seja repartido igualmente entre todos os colegas de casa.

O Brother Long também nos diz que quando um novo estafeta chega a Xangai, terá de gastar cerca de 10.000 RMB no início, geralmente antes de ter começado a trabalhar. Este montante inclui a renda e o depósito para a casa, compra ou aluguer (que também requer um depósito) de uma bicicleta movida a bateria, mais de 300 RMB de equipamento de estafeta, e outros tipos de despesas básicas. Se estiver casado ou enviar dinheiro para os seus pais todos os meses, a quantidade de dinheiro que resta para si próprio é ainda menor.

Perante o elevado aluguer e custo de vida, que actividades podem os motoristas ter no seu tempo livre? Ou talvez, tal como a rapariga do "Os Sapatinhos Vermelhos" de Hans Christian Andersen, que deve girar sem parar, eles só podem estar constantemente em movimento para ganhar a vida? Tornaram-se a maior garantia de uma vida urbana rápida e conveniente, mas não têm forma de desfrutar das conveniências e extravagâncias que eles próprios criam.

Para os estafetas que já constituíram uma família, este tipo de angústia é, sem dúvida, ainda pior. O Brother Long e a sua mulher já não se vêem há muito tempo. Apesar de estarem na mesma cidade, não podem deixar de se tornar uma versão do século XXI de Romeu e Julieta. E quanto aos estafetas que já têm filhos, as pressões e dificuldades da vida familiar são ainda muito mais severas.

Unir e exigir: será que a Aliança de Estafetas se tornará uma nova esperança para a ajuda mútua dos estafetas?

De acordo com as estatísticas, o número actual de estafetas activos em todo o país atingiu 3 milhões de pessoas. Eles são a pedra angular que sustenta o mercado de entrega de encomendas que produz quase 300 mil milhões de RMB por ano na China. A questão de como ajudar os estafetas a estabelecerem relações laborais mais justas no processo de realização dos seus sonhos merece a atenção de toda a nossa sociedade.

Como as plataformas não permitem aos estafetas organizar sindicatos, o facto de os trabalhadores terem utilizado plataformas de Internet para provocar uma mobilização espontânea é espantoso. Yongqiang e Brother Long pertencem separadamente a duas comunidades diferentes de ajuda mútua de estafetas.

A comunidade de ajuda mútua de que a Yongqiang faz parte chama-se "Aliança de Estafetas" e foi fundada por um estafeta em Pequim. O seu objectivo é unir e proteger os direitos dos estafetas. O seu dirigente em Pequim é também especialista na utilização de novas técnicas de meios de comunicação para a difusão mais ampla de conteúdos. Ele faz vídeos sobre muitas coisas que estão relacionadas com a vida dos estafetas - é um verdadeiro mestre do vídeo. Entretanto, Yongqiang vê os vídeos não só como um entretenimento, mas também como um caminho para o auto-aperfeiçoamento. "Depois do trabalho, quando outras pessoas estão entretidas com jogos, eu posso estudar um pouco. O meu estudo é ver como outras pessoas filmam vídeos".

Talvez o seu carácter otimista esteja intimamente interligado com a sua adolescência. O ex-soldado Yongqiang foi em tempos convencido a juntar-se a um esquema de marketing multinível por uma ex-namorada que tinha conhecido na Internet. Tendo acabado de fugir dessa infeliz experiência, depois de ter passado por inúmeras voltas e reviravoltas na vida, para além das perdas material e emocional, a sua experiência desse período de tempo levou-o, sem dúvida e imperceptivelmente, a sofrer uma transformação. Enquanto estava na organização de marketing multinível, dormiu no chão durante um longo período de tempo. Disse que nesse período de tempo, percebeu que "o chão é a maior cama do mundo, isso é algo que eu nunca esquecerei".

Esta experiência de ser enganado e afundado naquele pântano permitiu-lhe não só aprender a enfrentar activamente tudo na vida, mas também a mover o seu olhar do indivíduo para o sistema, obrigando-o a desenvolver uma grande preocupação pela vida e felicidade da comunidade de estafetas. O estilo de Yongqiang é construir uma comunidade face-a-face, deixando irmãos e irmãs participar em mais actividades e ter mais conversas e interações sociais de coração aberto. Ao fazê-lo, podem reforçar os seus laços de amizade e aliviar o stress. "Espero ser capaz de organizar actividades offline dentro desta comunidade, tais como criar uma bandeira comunitária, organizar jantares offline onde todos dividimos a conta, e assim por diante. Para que todos possam interagir plenamente e ter apoio."

Foi Jiang Yilong, o fundador da Hangzhou Delivery Driver Media, quem confiou a Brother Long a fundação da Shanghai Lujiazui Delivery Driver Media. Por que é que os canais de distribuição em massa foram capazes de se desenvolver e expandir tão rapidamente, expandindo-se de Hangzhou até ao distrito de Pudong em Xangai e, novamente, até ao distrito de Baoshan? Porque os fundadores dos canais de comunicação social sobre os estafetas fizeram muitas coisas práticas para ajudar esses estafetas.

Jiang Yilong foi precisamente o designer do "mapa de ordenação do número de edifícios para estafetas", para a área de Hangzhou,. Ele criou um mapa bidimensional para os bairros residenciais num raio de 5-10 quilómetros e depois rotulou-o com os números de edifícios. Isto tornou as coisas muito mais fáceis para os estafetas recém-integrados.

Para além disto, os canais de media criados por Jiang Yilong e Brother Long também ajudaram os estafetas a ligarem-se a alugueres, relativamente mais baratos, de bicicletas alimentadas por baterias, alugueres de baterias de lítio, reparações de bicicletas em situações de emergência, carregamento de baterias e outros serviços. Este tipo de ‘utilidades’ estendeu-se até ao campo das necessidades básicas dos estafetas, tais como apartamentos acessíveis, trabalhos secundários e assim por diante. Há também as "refeições do estafeta" de que Brother Long se orgulha bastante. No centro alimentar "Haitian Yijiao", em Lujiazui, Brother Long conseguiu baixar os preços de algumas refeições dos seus habituais 14 ou 15 RMB para 10 ou 12 RMB. Isto ajudou os estafetas a poupar uma boa quantia de dinheiro gradualmente ao longo do tempo, e também ajudou as empresas a resolver o problema da falta de clientes durante o período pandémico.

Na comunidade de estafetas, este tipo de prática de ajuda mútua baseada em áreas específicas tornou-se uma ocorrência comum. Se houver alguém na comunidade que tenha entrado em circunstâncias especiais e não possa entregar uma encomenda a tempo, ou se houver alguma necessidade de ajuda na vida ou no trabalho, os membros da comunidade encorajar-se-ão uns aos outros a ajudar. Para os estafetas, isto não é com o propósito de ganhar algo em troca, mas sim porque todos estão plenamente conscientes de que chegar à grande cidade para ganhar a vida não é uma coisa fácil. Se não se ajudarem uns aos outros, então é difícil estabelecerem-se na cidade.

"Onde quer que haja estafetas, haverá canais de media para estafetas". Este é o slogan que o fundador Jiang Yilong escreve em todos os posts nos canais de media dos estafetas. "Três sapateiros fracos podem fazer melhor do que até um génio como Zhu Geliang", o irmão Long sorriu-nos, ao dizer estas palavras transbordando de confiança.

Quando questionado sobre um acontecimento que lhe tivesse deixado uma impressão particularmente profunda, durante o seu tempo como estafeta, Brother Long respondeu: "Nos últimos dois dias, eu vi um irmão lá fora. Ele ia de biclicleta quando um gato saltou subitamente para a frente dele. Para evitar atingir o gato, ele travou a fundo e caiu da bicicleta e penso que até partiu as costelas ao cair. Quando o vi, dirigi-me até lá para ajudá-lo a levantar-se. E, precisamente nesse momento, surgiram outros dois tipos que também pararam e vieram ajudá-lo. Perguntei-lhe se estava tudo bem. Ele disse que não tinha dores mas, na altura, ele ainda tinha duas encomendas em mãos. Perguntei-lhe: tem a certeza de que está bem? Se não está, então deixe-me ajudá-lo a entregá-las. Ele apalpou-se e disse que não lhe parecia haver grande problema, mas achei que não tinha sido uma queda ligeira, porque todas as coisas dele se tinham espalhado por todo o lado quando ele caiu. Felizmente, a comida não se tinha entornado, caso contrário, ele próprio teria de pagar por ela. Depois disso, voltei a encontrá-lo e ele disse-me que só regressou a casa para descansar depois de ter terminado de entregar as encomendas. Ele ficou de cama durante dois dias, pelo que, na altura, não deve ter sido realmente uma queda ligeira".

Nas perspectivas da sociedade, das plataformas e dos consumidores, estes estafetas desempenham o papel de engrenagens dedicadas na máquina. Talvez só quando se encontram e se enfrentam a si próprios é que podem verdadeiramente vivenciar respeito mútuo e um sentimento visceral de simpatia uns pelos outros e tornar-se indivíduos vivos, cada um e todos deles. É este sentimento de pertença que talvez tenha contribuído para a característica excepcionalmente unida, positiva e cooperativa da comunidade de estafetas.

Epílogo

No segundo e terceiro dia após a entrevista, Ya Tong, uma das entrevistadoras, viu alguns vídeos de um grupo, ao qual pertencemos, de estafetas a serem empurrados e insultados por agentes de segurança pública ou pela polícia de trânsito, vídeo esse partilhado por um jovem administrador de um grupo de estafetas. Ela convidou também para o grupo dois outros ‘irmãos’ estafetas . "Várias semanas mais tarde, perguntei-lhes no grupo se os membros do grupo que fossem pais precisavam de algum serviço de orientação para aprenderem a interagir melhor com os seus filhos que tinham deixado para trás. Disseram, evidentemente, que há uma necessidade, mas os estafetas estão demasiado ocupados e são demasiado ineptos para se organizarem em grupo", disse ela.

Entretanto, outro entrevistador, Cai Cai, espera que a sociedade seja capaz de tratar bem os estafetas: "Tal como o exemplo da atitude de um porteiro, o cliente deve ser simpático e indulgente. Quando há qualquer acidente na estrada, pequeno ou grande, se as pessoas pudessem dar uma mãozinha, se uma bicicleta se virar, etc. Também membros de uma família - de facto, eles são a espinha dorsal".

Além disso, Cai Cai também partilhou um apelo de um delegado do Congresso Nacional Popular, que nos dá alguma esperança na protecção dos direitos dos estafetas.

China News Service: "Tendo em conta as características particulares das novas formas de emprego, tais como ‘gig employment’, estou a elaborar uma política de segurança social que garantirá de forma viável os direitos desta força de trabalho... Proponho que melhoremos ainda mais as nossas políticas e que amemos e cuidemos dos nossos estafetas". Nas duas sessões deste ano, as "ocupações emergentes", incluindo os estafetas, tornaram-se um tema apaixonadamente discutido entre os delegados. "Actualmente, as novas formas de emprego estão a diversificar-se, e as formas de conseguir um emprego estão claramente a aumentar".

Mais de 70 por cento dos estafetas vêm de províncias e de zonas rurais. O seu nível de educação não é elevado, e enfrentam dificuldades tais como uma elevada intensidade de trabalho, uma grave falta de instalações de apoio para salvaguardar o emprego, e um sistema imperfeito de protecção do trabalho e de segurança social, etc.

Para resolver esta questão, Yu Chunmei propôs uma moção para incorporar o grupo de estafetas sob a cobertura do seguro de indemnização dos trabalhadores locais. Nos casos comprovados de lesões no trabalho de estafeta, em que todos os factos sejam claros, os direitos e obrigações sejam claros, e ambas as partes envolvidas não tenham qualquer disputa, o Ministério dos Recursos Humanos e da Segurança Social tratará do assunto de modo a que este seja rapidamente determinado e resolvido. Ao mesmo tempo, foi também proposta a inclusão de "estafetas" no "Directório Nacional de Qualificações Profissionais" do Ministério dos Recursos Humanos e da Segurança Social, expandindo assim operações como a formação de aptidões profissionais.

Available in
EnglishFrenchPortuguese (Brazil)SpanishGermanPortuguese (Portugal)
Author
Tangzhe Li
Translator
Sofia Alcaim
Date
12.10.2020
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