Briefing

Newsletter IP | N°44 | Aos milhares, aos milhões

Com o desdobramento do genocídio cometido por Israel em Gaza, milhões tomam as ruas pedindo pela libertação da Palestina.
Na 44ª Newsletter da Internacional Progressista em 2023, nós olhamos para o surgimento do movimento global que se coloca em defesa da Palestina e que se opõe à cumplicidade dos crimes brutais e de longa data perpetrados pelo regime israelense. Se você quiser receber nossa Newsletter diretamente no seu email, basta assiná-la usando o formulário disponível no fim desta página.

Em pouco mais de três semanas, mais da metade das casas de Gaza foram destruídas. Mais de 1,4 milhão dos 2,3 milhões de habitantes da pequena faixa foram deslocados. E bem mais de 8.000 pessoas foram mortas, mais de 40% das quais eram crianças.

O horror deste massacre contínuo é difícil de transmitir.

Vemos imagens e vídeos de bairros destruídos; corpos de crianças sem vida, cinzentos e vermelhos; avôs, avós, pais, mães, esposas, maridos, irmãs, irmãos chorando, procurando nos escombros aqueles que se perderam. 825 famílias inteiras foram exterminadas—gerações inteiras apagadas do registo civil. A violência é tão grave que os médicos de Gaza tiveram de cunhar um novo acrônimo médico: WCNSF: “criança ferida, sem família sobrevivente” (Wounded child, no surviving family, do original em inglês).

Ouvimos histórias humanas enquanto palestinos, palestinas e seus aliados e aliadas tentam se opor a sua cruel desumanização através da propaganda ocidental e israelense. Sobrinhos com contas no Instagram que não postarão mais, filhas jogadoras de futebol que marcaram o último gol, jovens amantes que compartilharam o último passeio na praia.

O povo palestino não pode ser deixado a defender sozinho a sua dignidade. As estatísticas horríveis, as imagens chocantes, as histórias trágicas deveriam resultar em ação.

E elas estão.

Nas últimas semanas assistimos a grandes mobilizações globais. Por todo o planeta, as pessoas se uniram em protestos de rua. Enormes marchas, manifestações e protestos ocupam o mundo. Eles se multiplicam, se espalham e crescem. Eles aprendem um com o outro. Hoje a Grand Central Station, na cidade de Nova Iorque, amanhã na Rua Liverpool, em Londres, estão repletas de milhares de pessoas que exigem um cessar-fogo e a libertação nacional palestina.

A essas manifestações junta-se uma ousada ação direta contra a própria máquina de guerra israelense. Ativistas, trabalhadoras e trabalhadores estão bloqueando a produção e distribuição de armas de guerra, jogando areia nas rodas da campanha assassina de Israel e iluminando a estrutura global da máquina de guerra. Como explicou Ahmed Alnaouq, um palestino que já perdeu 23 familiares no bombardeio: “Os israelenses puxaram o gatilho. Mas foi um F16 de fabricação americana que foi usado para matar minha família. E foram os meios de comunicação ocidentais que forneceram a cobertura e o sinal verde.”

Mais solidariedade prática contra a máquina de guerra, que aparentemente “está de olho em grandes lucros” com o conflito, é necessária e está a caminho. Num apelo urgente, publicado pela Internacional Progressista, os sindicatos palestinos apelaram aos seus irmãos e irmãs no movimento trabalhista global para se manterem solidários com eles, recusando-se a construir armas destinadas a Israel ou a transportar armas para Israel. O chamado deles foi ouvido. O sindicato italiano de logística Si Cobas anunciou que os seus membros não transportarão qualquer armamento para Israel e quatro sindicatos belgas anunciaram a sua “recusa em manusear equipamento militar destinado à guerra na Palestina”. Eles estão fazendo da solidariedade mais do que um slogan.

O mesmo acontece com alguns governos do Sul Global, que vão além dos apelos a um cessar-fogo e colocam pressão diplomática adicional sobre Israel, cortando relações com o regime israelense. Colômbia, Chile, Bolívia, Jordânia e Bahrein cortaram relações, expulsaram os embaixadores de Israel para o seu país ou chamaram de volta os seus próprios embaixadores de Israel. A África do Sul tem feito um chamado para que Israel seja responsabilizado pelas suas violações do direito internacional. O equilíbrio do poder normativo e moral na comunidade internacional oscila de Norte para Sul.

É por isso que, em parte, o controle dos EUA e do Reino Unido sobre as suas populações é tão fraco. Dois terços dos norte-americanos querem um cessar-fogo; apenas oito por cento da população britânica se opõem a um. Esta rejeição das políticas dos seus governos ocorre apesar do apoio quase total a Israel e aos seus crimes na classe política dos meios de comunicação dos EUA e do Reino Unido.

Mas as mobilizações atuais e as ações globais também podem mudar o rumo dos “acontecimentos na base”. Ao aumentar o custo dos crimes de Israel tanto para o governo israelense quanto para os seus apoiadores norte-americanos e britânicos, o movimento de solidariedade global pode fortalecer o movimento de libertação nacional palestino. Não pretendemos apenas a paz, mas também justiça para palestinos e palestinas: o fim da Nakba após 75 anos.

Este processo de fortalecimento da população palestina na sua luta necessariamente empurra os países do Sul Global, os atores sociais e políticos, bem como as forças genuinamente progressistas do Norte contra o imperialismo. Como Joe Biden, então ainda senador Biden, disse no plenário do Senado dos EUA em 1986: “Se não houvesse Israel, os Estados Unidos da América teriam de inventar um Israel para proteger os seus interesses na região”.

O potencial deste momento estende-se para além da paz na Ásia Ocidental, para além da própria libertação palestina. O potencial desse momento estende-se em direção a uma democratização da ordem global. Os crimes de Israel contra a população da Palestina são sustentados por essa ordem, que privilegia o império dos EUA acima de tudo. Leis, normas e tribunais são apenas uma máscara sobre o poderio militar e econômico. Este conflito revela esta realidade com uma clareza ofuscante.

Ele também demonstra também como os EUA, o Reino Unido e o ‘clube imperial’ não são, eles próprios, democracias, apesar das suas afirmações imponentes. Para os povos do Norte Global, o imperialismo no exterior significa oligarquia interna. Os enormes lucros gerados pelo controle e pela extração de recursos em todo o mundo são a fonte do poder político destas classes dominantes.

O imperialismo no exterior também significa repressão interna. As mesmas armas que são testadas na população cativa palestina voltam para reprimir manifestantes em Londres ou para policiar a fronteira entre os EUA e o México. Portanto, para conquistar a nossa libertação coletiva, temos de destruir o domínio imperial internacional.

Este momento de ação popular global de apoio e suporte à Palestina pode tornar-se um exemplo brilhante de como o motim do Norte pode unir-se ao motim do Sul contra uma ordem capitalista e imperialista que destrói vidas e o nosso planeta.

É por isso que hoje, amanhã e até a vitória levantaremos as nossas vozes para gritar com orgulho: aos milhares, aos milhões, somos todos palestinos.

Últimas do Movimento

A Resolução-Gaza

“Nós…compreendemos que a violência fascista contra o povo palestino hoje prenuncia a violência do imperialismo ocidental contra todos os trabalhadores e povos oprimidos do mundo amanhã porque esta é a tendência histórica do capitalismo em decadência…”

Mais de 50 movimentos, partidos e sindicatos em todo o mundo comprometeram-se a defender a libertação palestina e a romper os laços de cumplicidade com o estado de Israel. A Resolução reconhece as raízes coloniais, imperialistas e capitalistas da opressão do povo palestino e responde às exigências levantadas pelo movimento palestino de libertação nacional. Você pode ler a Resolução aqui.

Dignidade para trabalhadoras e trabalhadores do setor de vestuário em Bangladesh

Trabalhadores e trabalhadoras do setor de vestuário em Bangladesh estão empenhados numa luta ativa por melhores salários e por dignidade. Eles e elas estão fazendo campanha por um salário mínimo mensal de US$209. Esses trabalhadores e trabalhadoras fazem roupas e dão lucro para algumas das maiores marcas do mundo, incluindo a Amazon, e ainda assim não têm direito a um mínimo de US$209 por mês. Eles e elas não estão apenas colocando os seus empregos—mas também as suas vidas—em risco, exigindo direitos e dignidade. Esta semana, a polícia de Bangladesh disparou e matou Rasel Howlader, um maquinista de 25 anos, que fazia campanha pelo salário mínimo.

Uma das membras do Conselho da Internacional Progressista, Nazma Akter, está  liderando esta luta. Traremos mais novidades nas próximas semanas.

Honduras Resiste

A Internacional Progressista está se mobilizando e indo para Honduras para ouvir diretamente as comunidades afetadas pelas ZEDEs (Zonas de Emprego e Desenvolvimento Econômico, em tradução livre), para chamar a atenção internacional para o crime do colonialismo corporativo e para apoiar o governo da Presidente Xiomara Castro a derrotá-lo. O caso também é explicado em um artigo recente na Jacobin aqui.

O Mada Masr está sendo atacado

Denunciamos nos termos mais fortes o ataque do Estado egípcio ao Mada Masr, parceiro da Agência da Internacional Progressista. A empresa de comunicação social foi encaminhada ao Ministério Público e teve o seu website bloqueado durante seis meses devido às suas reportagens sobre os crimes de guerra de Israel em Gaza.

Arte: The Sea is Mine (O Mar é Meu, em tradução livre) por Silman Mansour mostra uma mulher, uma garota e um garoto de mãos aos céus e marchando por uma praia. A caneta e o pincel simbolizam a criatividade, o rifle significa resistência, e o ramo de oliva e a pomba branca representam paz. A chave é um símbolo na luta palestina pelo retorno de seus refugiados e refugiadas.

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Date
03.11.2023
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