A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas foi estabelecida por governos mundiais em 1992, criando as reuniões anuais da Conferência das Partes (COP) para negociar acordos climáticos.
Apesar de esperanças recorrentes e da enorme fanfarra em torno do projeto, o sistema COP fracassou de acordo com qualquer medida objetiva. As emissões globais de CO2 aumentaram de 22 bilhões de toneladas métricas em 1992 para 37 bilhões em 2024. Surpreendentemente, mais da metade das emissões totais de CO2 da humanidade ocorreram desde 1992—correspondendo à aceleração da transferência de valor da periferia para o império que se seguiu à queda da União Soviética.
Longe de desacelerar a destruição planetária, a COP coincidiu com sua aceleração. Os últimos 12 meses estiveram 1,6 graus (Celsius) acima das médias pré-industriais—além do limite em que pontos de inflexão irreversíveis se tornam "prováveis" de acordo com a ciência estabelecida. Um desses pontos de inflexão é o derretimento da camada de gelo da Antártida Ocidental, que contém água suficiente para elevar os níveis globais do mar em sete metros.
Esse fracasso catastrófico que perpassa duas gerações de líderes mundiais não é um acidente. Muito pelo contrário, ele é uma característica do sistema, produzida e refletida nas divisões de classe dentro e entre os países do globo.
Reduzir as emissões anuais de CO2 significa deixar combustíveis fósseis enterrados onde estão—muitos deles. Entretanto, esses ativos valem dezenas de trilhões de dólares. Se eles se tornassem inúteis, não apenas as Big Oil (grandes corporações envolvidas na indústria do petróleo e seus derivados) entrariam em colapso, mas os bancos que as financiam enfrentariam perdas tão grandes que poderiam desestabilizar todo o sistema financeiro.
Reduzir o excesso de emissões que destroem nosso planeta significa acelerar a reorientação da ordem econômica global para longe dos culpados imperiais e em direção às periferias afetadas. Essa ameaça sistêmica impede que outros setores do capital—mesmo aqueles que enfrentam perdas por perturbações climáticas, quebras de safra e elevação do nível do mar—se oponham efetivamente aos interesses financeiros e de combustíveis fósseis que mantêm reformas e financiamento severamente limitados.
Tomemos como exemplo o financiamento climático. Na COP15 em Copenhague em 2009, 43 nações ricas prometeram US$ 100 bilhões (R$ 600 bilhões) em financiamento anual "novo e adicional" até 2020 para ajudar os países do Sul Global a lidar com as mudanças climáticas. Embora US$ 100 bilhões pareçam substanciais, eles representam apenas 0,1% da produção econômica global—dificilmente uma prioridade por qualquer medida.
Esses US$ 100 bilhões parecem uma formiga diante do montante de US$ 242 trilhões apropriados do Sul pelo Norte Global em recursos entre 1990 e 2015. Como Jason Hickel e colaboradores demonstram em um artigo recente, essa drenagem representa mais de 10% da produção econômica global fluindo não remunerada do Sul para o Norte anualmente.
Os países ricos não conseguiram atingir nem mesmo essa modesta meta até 2020. Eles alegaram sucesso em 2022, mas depois de redirecionar os gastos de desenvolvimento existentes como financiamento climático, o financiamento "novo e adicional" real atinge apenas cerca de US$ 75 bilhões. A porcentagem total do PIB que os países ricos gastam em financiamento de desenvolvimento, incluindo financiamento climático, na verdade diminuiu de 0,45% em 2009 para 0,44% em 2022.
Esses valores ficam dramaticamente aquém das necessidades do Sul. Na COP deste ano, os negociadores do Sul, apoiados por especialistas, exigiram US$ 1,3 trilhão anualmente até 2035 (o equivalente a R$ 7,9 trilhões). Os países ricos prometeram apenas US$ 300 bilhões—muito abaixo do que é necessário.
O que os países do Sul perceberam é que eles não podem esperar que os governos do Norte—controlados pelo lobby dos combustíveis fósseis e por interesses financeiros—mudem de rumo. O Sul deve encontrar caminhos alternativos para a sua sobrevivência.
Uma dessas iniciativas alternativas vem se desenrolando no Palácio da Paz em Haia, onde o Tribunal Internacional de Justiça (TIJ)—a mais alta corte do mundo—está ouvindo o maior caso climático da história. Liderado por Vanuatu e movido por países e povos que compõem as ilhas do Pacífico, o caso busca responsabilizar legalmente as nações mais ricas pelo colapso climático em andamento, que ameaça particularmente os estados insulares do Pacífico.
Em seu discurso ao Tribunal, o enviado especial de Vanuatu para mudanças climáticas e meio ambiente, Ralph Regenvanu, colocou a responsabilidade diretamente em "um punhado de estados facilmente identificáveis" que produziram a maior parte das emissões. Essas emissões impulsionaram a elevação dos mares e desencadearam desastres graves em Vanuatu. Como Regenvanu declarou, "Nós nos encontramos na linha de frente de uma crise que nós não criamos."
A equipe jurídica de Vanuatu, incluindo o membro do Conselho da Internacional Progressista, Julian Aguon, argumenta que as nações mais ricas violaram o direito internacional ao emitir novas licenças de extração de combustíveis fósseis, subsidiar o setor e não fornecer financiamento adequado aos estados do Sul Global nas negociações da COP.
O TIJ revisará as evidências na próxima semana antes que seus juízes e juízas emitam uma opinião consultiva. Embora não-vinculativa (non-binding), esta decisão servirá como uma referência autoritativa em futuros litígios climáticos e negociações internacionais.
Assim como o caso do TIJ da África do Sul contra Israel pelo genocídio palestino, estamos presenciando as nações do Sul usando estrategicamente instituições criadas pelo próprio Norte Global a fim de expandir o espaço para as suas próprias resistências.
Governo turco reprime manifestantes pró-palestina
Na semana passada, investigadores envolvidos na campanha Stop Fueling Genocide, apoiada pela Internacional Progressista, revelaram que a Turquia ainda exporta petróleo para Israel, apesar de seu próprio embargo. A investigação, que foi coberta pela mídia turca, descobriu que o petróleo bruto azeri foi enviado diretamente do Porto de Ceyhan, localizado na província de Adana, no sul da Turquia, para Ashkelon, Israel.
Desde a revelação, manifestantes têm perseguido o presidente turco Recep Tayyip Erdoğan, exigindo que o país institua o bloqueio econômico a Israel que ele mesmo anunciou.
Nove manifestantes do Filistin İçin Bin Genç, um movimento jovem por uma Palestina Livre com base na Turquia, foram presos na segunda-feira, 2 de dezembro, pelo governo turco. Eles enfrentam acusações de insultar o presidente e, até sexta-feira, 6 de dezembro, ainda estão presos.
IP em Honduras
Entre 23 e 28 de novembro de 2024, a Internacional Progressista retornou a Honduras com uma delegação internacional de alto nível de especialistas, acadêmicos e acadêmicas, figuras políticas e representantes de organizações da sociedade civil da América Latina e dos Estados Unidos. A missão da delegação era apoiar a decisão do governo da presidente Xiomara Castro de rejeitar o sistema de tribunais privados do Banco Mundial, o Centro Internacional para Resolução de Disputas de Investimentos (ICSID); a decisão da Suprema Corte de que o sistema de zonas econômicas especiais extremas, conhecidas como ZEDEs, é inconstitucional; e para ouvir as comunidades afetadas pelas ZEDEs.
Durante a visita, foram realizadas reuniões produtivas com altas autoridades do governo hondurenho, incluindo: o Secretário Particular da Presidente Xiomara Castro, o Procurador-Geral, o Vice-Ministro das Relações Exteriores de Honduras, o Comissário Presidencial para as ZEDEs, a Ministra do Turismo, o Prefeito e o Governador de Roatán, entre outras figuras importantes na luta contra o ISDS.
Um conto de duas cidades
O think-tank britânico e membro da Internacional Progressista, o Common Wealth, produziu um novo relatório detalhado sobre duas antigas cidades industriais nas East Midlands da Inglaterra. Longe de serem esquecidas ou deixadas para trás, as antigas cidades de mineração e manufatura da Inglaterra têm sido campos de testes para sucessivas ondas de formulação de políticas neoliberais.
Embora essas políticas tenham fracassado em seu objetivo declarado de gerar empregos bem remunerados, elas foram bem-sucedidas em transformar antigos centros industriais em centros de logística e de trabalho do cuidado.
Você pode explorar o mapa interativo e inovador do relatório aqui.
Familiar repressão, repressão familiar na Índia
Na sexta-feira, 6 de dezembro, agricultores indianos começaram uma marcha de Punjab até a capital do país, Déli, para exigir melhores preços para suas colheitas, nenhum aumento nas tarifas de eletricidade, perdão das suas dívidas e pensões para agricultores e trabalhadores rurais. Eles foram recebidos com gás lacrimogêneo e spray de pimenta da polícia.
Esses acontecimentos ocorrem apenas dois anos depois que o primeiro-ministro, Modi, foi forçado a derrubar duas leis extremamente impopulares diante da maior greve da história da humanidade levada a cabo por agricultores indianos e seus aliados trabalhadores.
Biden, tire Cuba da lista!
Mais de 50 autoridades eleitas, líderes trabalhistas e organizações de solidariedade nos Estados Unidos pediram ao presidente Joe Biden para que ele use o tempo restante no cargo e remova Cuba da lista de 'Estados Patrocinadores do Terrorismo', alive as sanções da era Trump e envie ajuda humanitária para a ilha.
Você pode ler a carta e a lista completa de nomes aqui.
A Google sabia dos crimes mas concordou assim mesmo
Novas reportagens do The Intercept e do The New York Times revelam que o CEO do Google Cloud, Thomas Kurian, foi informado sobre as implicações do Projeto Nimbus para os direitos humanos e assinou na linha pontilhada assim mesmo—colocando as aspirações de contratação militar e lucro da Google acima das vidas palestinas.
O Projeto Nimbus é um contrato de US$ 1,2 bilhão (aproximadamente 7,3 bilhões de reais) entre a Google, a Amazon e Israel para fornecer serviços de computação em nuvem. Apesar das alegações da Google de que o Projeto Nimbus “não é direcionado a fluxos de trabalho altamente sensíveis, classificados ou militares relevantes para armas ou serviços de inteligência”, uma nova pesquisa mostra que pelo menos 70% da receita governamental do Projeto Nimbus é um fluxo direto de dinheiro do exército israelense para a Google.
Leia a declaração dos funcionários do Google que se organizam com a campanha No Tech for Apartheid sobre as últimas revelações aqui.
O fim de Yoon Suk-yeol
Após uma tentativa frustrada de autogolpe, o presidente sul-coreano Yoon Suk-yeol enfrenta um processo de impeachment. Ele declarou lei marcial, apenas para enfrentar protestos imediatos e ter seu decreto anulado no parlamento.
Ao fazer isso, "o regime Yoon Suk-yeol declarou o seu próprio fim no poder", de acordo com a declaração da Confederação Coreana de Sindicatos (KCTU) publicada pela Internacional Progressista.
Glovo volta atrás
A Glovo, empresa espanhola de entrega de comida, foi forçada a cumprir a Lei dos Motociclistas da Espanha, proposta pela Ministra do Trabalho Yolanda Diaz. A Glovo concordou em encerrar seu falso modelo de trabalho autônomo e reconhecer oficialmente mais de 15.000 motociclistas como funcionários, após pressão constante do sindicato CCOO e outros.
Breyten Breytenbach (16/09/1939 - 24/11/2024)
Breyten Breytenbach, dissidente, escritor e pintor sul-africano , morreu em Paris em 24 de novembro. Ele passou sete anos nas prisões do apartheid, dois deles em confinamento solitário.
Seus poemas durante o tempo de encarceramento são requintados. Em Your Letter is Delightful, ele relata a experiência de receber uma carta de sua esposa Yolande Ngo Thi Hoang Lien
"your letter is delightful,
larger and lighter than thoughts of a flower when the dream
is the earth of the garden,
as your letter opens there is an unfolding of sky,
of word from the outside of ample spaces."
Seus poemas, maravilhosamente revigorantes, arrancaram a língua africâner, a língua predominante da classe trabalhadora negra em partes da África do Sul e da Namíbia, das garras sufocantes do apartheid, que buscava negar seu vigor e suas origens crioulas.
"die maan is ‘n silwer skree
the moon is a silver scream"
Breytenbach vivia em Senegal quando recebeu a notícia do falecimento de Mahmoud Darwish em 2008. Ele estivera com Darwish, o grande poeta palestino, na França algumas semanas antes.
O sol estava se pondo, havia um vento silencioso nas árvores e das ruas vizinhas podíamos ouvir as vozes das crianças brincando. E por horas nos sentamos nos antigos assentos de pedra, encantados pela profundidade e beleza desta poesia.
No ano seguinte, ele publicou "Voice Over: a nomadic conversation with Mahmoud Darwish". Os poemas, oferecidos em inglês e africâner e marcados por perdas pessoais e políticas, entrelaçam as vozes dos dois poetas.
"Wait a little so that wind
not bewilder me
I will protect our dreams like mirrors
for we have seen the faces of
those
who will throw our children
from the windows"
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Arte da Semana: Robin White (Ngāti Awa, 1946 Te Puke, Aotearoa, Nova Zelândia) é conhecida por sua serigrafia, pintura e trabalhos colaborativos em tecido Tapa. Ela é de uma comunidade de artistas pacifistas que fugiram para a zona rural da Nova Zelândia na década de 1970 para viver estilos de vida remotos e simples. Ela é reconhecida por suas paisagens pintadas durante esse período, retratando colinas cultivadas, edifícios coloniais simples e moradores estóicos de ascendência britânica e do Pacífico.
Robin White voltou-se para a prática de Tapa na década de 1980, quando sua família estava baseada no remoto atol do Pacífico de Kiribati, o primeiro país ameaçado de ser submerso pela elevação do nível do mar. Tapa envolve uma laboriosa transformação coletiva de casca de árvore em tecido, sobre o qual são aplicados corantes naturais. As formas geométricas na obra, que tem quase três metros de largura, representam o mar. Em 2013, o presidente Tong falou da elevação do nível do mar induzida pela mudança climática como "inevitável".